sexta-feira, 30 de março de 2018

Galos, noites e quintais... - Kelsen Bravos*

Nesse 30 de março de 2018, aproveitei o feriadão para rever familiares e amigos em um lugar bucólico, daqueles de se acordar com o canto dos galos, aquecer-se junto a fogueiras ou a um fogão a lenha e se reunir em bate-papos sem fim nos quintais. Por tamanho prazer, ignorei avisos sobre a insegurança nas estradas, seja pelo péssimo estado de conservação em tempos de chuva ou quanto ao “salve geral” de facções do crime ameaçando motoristas de ônibus, caminhões ou carros comuns que ousassem se aventurar pelas rodovias cearenses. A despeito de tais recomendações, peguei a família e seguimos rumo oeste para aquela serra que ainda azula no horizonte, de onde despenca a cachoeira em que, segundo José de Alencar, se banhava Iracema - a famosa Bica do Ipu.

Redobrei minha atenção e cumpri pouco mais de 320 quilômetros, de muito boas e seguras rodovias (exceto as carroçáveis), entre Fortaleza e uma localidade bem no topo de Ipu. Um recanto que abriga famílias de agricultores no alto da Serra da Ibiapaba. Um lugar modesto onde se comprova o impacto, para o bem e para o mal, dos programas de transferência de renda com todas as suas contradições, com saldo, ao final das contas, de longe favorável aos benefícios. As mercearias todas bem sortidas e com os pagamentos em dia, a população bem vestida e saudável, assistida por escolas e posto de saúde que vinha até pouco tempo funcionando regularmente. Com os programas de financiamento, a agricultura familiar se muniu de implementos para seu cultivo, perfuração de poços artesianos (a seca chegou pesada também no alto da serra) e compra de tratores, caminhões para o escoamento da produção aos grandes centros e Capital. As motocicletas circulam a centenas em toda a região. Aspectos aparentes até ao olhar mais desatento.

Por outro lado, salta ao olhar mais crítico a falta de programas de cultura e de ampliação de lazer para população que, com um pouco mais de poder aquisitivo e sem uma referência de qualidade, adota os piores hábitos consumistas. Compra do fútil ao inútil. Chega-se ao cúmulo de consumir alimentos industrializados tendo à janela de suas casas laranjas, tangerinas, pitangas, seriguelas, mangas, bananas, abacates, cambuins, enfim uma sorte de frutas in natura e bem mais saudáveis.  Desprezam também a cozinha tradicional de origem local, uma delícia da qual não abro mão é o bolo manzape, uma iguaria tabajara feita com massa puba de mandioca, melaço de cana de açúcar, coco babaçu, envolvido na folha de bananeira e assado no forno da casa de farinha, onde também são produzidas da forma tradicional a goma e a farinha de mandioca, um alimento completo em tudo - em sabor e nutrientes.

Ao chegar, faço questão de me reunir com os mais velhos. A conversa vai do futebol à política. Sim, num tem essa bobagem de não se falar desses temas, eles se misturam sim e é muito bom falar deles. Há muito pouca dissidência quanto em quem votar para presidência da República. Todos são muito gratos aos benefícios dos governos de esquerda antes do golpe. Quanto ao futebol, as paixões pelo clube tal ou qual se esmaecem pelo consenso do Serrano - time composto pelos craques locais que, liderados por Francisco de Assis Moura – o Assisaço, todas as tardes se reuniam para jogar no campo de várzea até a hora do sol se pôr.

Saibam, pois, este time, forjado na fibra da lida agrícola, brilhou no campeonato intermunicipal cearense de forma vitoriosa, derrotou em amistosos grandes times profissionais do Estado. Uma geração que ainda joga um bolão pela seleção de veteranos. Hoje é rara, lamento, a prática do futebol ao fim das tardes. Uma tristeza o esporte não ser adotado pelas novas gerações, ocupada em hábitos, no mínimo, danosos.

Sem muitas alternativas de fruição social, uma geração perdida está em formação, pois suscetível ao “lazer” das bebidas alcoólicas, dos paredões de som e, infelizmente, do consumo de drogas (da “inocente” maconha ao inferno do crack). Tal realidade tem sido responsável pela dor de muitas famílias que veem os seus rebentos serem assassinados pela mão do tráfico, que gradativamente vem tomando conta de toda a Serra da Ibiapaba.

Converso também com a meninada. Adoram histórias e dizem ter esperança de ter uma biblioteca ativa - a da Associação de Moradores só está existindo no papel - que proporcione amplas leituras de mundo. A igreja católica é bem atuante, pode ser mais. Há o crescimento das igrejas neopentecostais que agregam fiéis, ao mesmo tempo que os segregam em torno de suas crenças. Acredito que a união do estado e segmentos sociais possam colocar no contexto social da região alternativas que unam as gerações e tenhamos, sem olhares lacrimosos da saudade, a emoção de viver, aos modos de hoje, a saudável realidade de galos, noites e quintais com os folguedos ainda bem vivos na memória do seu Luís Rosa, do Assisaço, da Dona Tarcisa, do Antôno Gaspar, do José Soares... e na esperança da garotada feito o Davi, a Letícia, a Clarisse, a Maria Júlia, a Ticiane e da novíssima geração do Miguel, do Samuel que ainda engatinha... Evoé!


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*Kelsen Bravos - professor, escritor, compositor, editor do Evoé!

quarta-feira, 28 de março de 2018

Glória - Chico Araujo


São muitos os possíveis sentidos para a palavra glória, e, portanto, vários os contextos em que ela pode ser utilizada, à semelhança do que acontece com tantas outras em nossa língua. "Glória"! E haja "glórias"... E "Glórias".

Alguém pode ser considerado em estado de glória, quando realiza fatos extraordinários. Sem citar nomes aqui, para não cometer injustiças, me ocorrem, como realizadoras de eventos admiráveis, aquelas pessoas que dedicam sua existência em benefício da existência de outros.

Então, aquelas que dividem seu único pão com quem não tem nenhum; aquelas que pagam uma quentinha de almoço a quem lhe pediu um trocado; aquelas que dedicam horas de seu dia a ações caridosas em casas de idosos; aquelas que destinam parte de seus ganhos – mesmo que parte pequena – a instituições que atendem pessoas de grande carência; aquelas que não se cansam de ensinar quem não sabe e precisa aprender, quem está distante da leitura e carece de saber ler; aquelas que largam seus afazeres para acompanharem outras em carências pessoais – como a esposa destinada a seguir o esposo em momento cirúrgico. Não são obrigações; são momentos de glória. Pela dimensão e intensidade de alguns, verdadeiros atos de heroísmo.

Tudo bem, vamos a alguns nomes que estiveram e estarão sempre em glória: Stephen Howking, Einstein, Charles Darvin, Mahatma Ghandi, Madre Teresa de Calcutá, Martin Luther King, Padre Mororó, Bárbara de Alencar, Frei Damião, Chico Xavier, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Érico Verissimo, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Lygia Fagundes Teles, Cora Coralina, Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Dorival Caymmi, Altamiro Carrilho, Naná Vasconcelos, Pavarotti, Plácido Domingos, Andrea Bocelli, Frida Kahlo, Tarsila do Amaral... São tantos, de tantas épocas, de tantas vocações...

Dentre os que me estão mais próximos, cito: Estela Araújo, Gláucia Lima, Kelsen Bravos (a partir dele, Juliana Holanda, “anjo preto”, segundo D. Zezé – ambas citadas e presentificadas em Apagão. Em meio ao caos, Luz, poesia e solidariedade de Juliana Holanda), D. Rosa Sampaio, Marcos Sampaio, Hamilton Nogueira, Sulling Rodrigues Lima, Euclides Themoteo, Gurgel Mendes, Mauro Mendes, Marina Cavalcante, Raul Porfírio, Aparecida Silvino, Paulo Ângelo Florêncio, Fabrício da Rocha, Dário Barreto...

Perceba-se: estar em "glória" não implica estar "na fama", ser exatamente uma "celebridade" – embora a "glória" de muitos se restrinja a essa, muitas vezes, fugaz característica, enquanto a de outros se expresse, digna, correta e merecidamente pela popularização de suas atitudes, de seus atos, de seus pensamentos revelados, o que lhes assegurará alguma fama.

Entenda-se que o desejo nosso aqui repousa no fato de buscarmos associar "glória" a "honra", a “brilho”, a “bem-aventurança” pela magnificência dessas características quanto aos atos praticados e aos pensamentos propostos pelos glorificados. É, isso, algo muito delicado. Pode não haver consenso. Pode haver quem ponha dúvida quanto ao merecimento deste ou daquele à glória.

Eu mesmo não sou muito afeito a perceber glória num atleta de futebol a receber salário milionário, desejando mais milhões na renovação do próximo contrato, porque considera ser essa a lógica envolvendo a suposta qualidade de seu futebol – tenha ele o nome que tiver.

Também não vejo glória alguma em quem se permite ficar trancafiado em ambiente por alguns meses tendo por objetivo a conquista, ao final do período de ampla privação e tantas "provações", de milhão e meio de reais. Alguns dizem haver "heroísmo" nessa vivência. Eu não.

Em visão ampla e associada, heroísmo também é componente de glória. De minha parte, entendo não existir nem heroísmo, tampouco glória em experiência do tipo dessa citada logo acima. Talvez haja a busca da fama (pela exposição cotidiana); talvez haja o interesse em se tornar popular pela mídia por não ter condições de conseguir a popularidade almejada por meios próprios e menos expositivos. O mais certo é o desejo da conquista do prêmio maior e, para alcançá-lo, faz-se de um quase tudo para merecê-lo. Não vejo glória aí. Há quem defenda. E ganhe muito dinheiro com essa defesa.

Estará em glória quem evidencie grande mérito por alguma atitude sua, continuada, ou mesmo ímpar, contanto que por meio dela caracterize sua superioridade. E quando se vê uma profunda ascendência de alguém em comparação a outro alguém em plena simplicidade registrada no cotidiano? Observemos.

Em noite de apagão elétrico, na escuridão, ao descer do ônibus, uma jovem vê uma senhora de idade avançada meio que perdida na calçada, submergida no negrume, próxima à parada onde esteve o transporte coletivo, sem saber se permaneceria estacada, ou se seguiria, próximo passo a lançá-la em um breu maior e de mais intensa instabilidade. A jovem vê também que a senhora não tem auxílio, cada pessoa próxima a ela somente na preocupação de resolver seu próprio destino. A jovem põe de lado seus interesses, suas precisões e estende a mão, oferece o braço à desconhecida senhora, seguindo com ela pela imensidão do escuro, conversando com ela, conhecendo-a um pouco, dando a ela a possibilidade de sentir-se tranquila, acomodada, acolhida, vitoriada. Um “anjo preto”, a jovem. Um ser maravilhoso, um ser de excelência, um ser genial. Um ser de “Glória”!

E que os pássaros cantem...

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*Chico Araújo - professor, poeta, contista e compositor, publica toda quarta-feira no Evoé! O título "Glória" compõe o Abecedário de Crônicas do Evoé e foi escrito entre 18 e 24 de março de 2018. Leia mais Chico Araújo em Vida, minha vida...


Notas de fim de texto
1. Apagão. Em meio ao caos, Luz, poesia e solidariedade de Juliana Holanda é publicação de Kelsen Bravos, em 22 de março, construída em processo de intertextualidade com texto "Cada vida no pedaço desse chão importa", de Juliana Holanda, podendo ser lido em https://kelsenbravos.blogspot.com.br/.

segunda-feira, 26 de março de 2018

GRANDE amor - *Túlio Monteiro



...É desconcertante rever um grande amor...

Tom Jobim


Depois de vinte e cinco anos de total separação – um quarto de século - eis que por conta dessa tal Internet redescobri alguém que jurava nunca mais veria ou ouviria falar. Foi um GRANDE amor vivido intensamente ainda em minha fase de menino virando homem feito e já com uma tonelada de responsabilidades sobre as costas, qual saco de matalotagem carregado sobre elas de maneira peculiar e cansativa.
Mas, hoje, caros ledores, resolvi abrir o coração e falar de como tudo aconteceu. Para isso, não se surpreenda se utilizar-me de subliminares para proteger aquele nome em um codinome beija-flor.
Conheci-a e a sua família quando ela ainda tinha tenros dez anos de idade e eu pouco mais de dezessete. Não! Não se trata de mais um caso de pedofilia explícita e sim de um amor pela irmã caçula que nunca tive. Sua meiguice me cativou desde o primeiro conhecer, tendo isso ocorrido em uma daquelas colônias de férias dos idos anos 1980, onde passávamos dez, às vezes quinze dias em total harmonia com a natureza das praias do nosso imenso Ceará.
Tornamo-nos grandes amigos, apesar da diferença de idade uma vez que seu quociente de inteligência atingia facilmente o meu no quesito compreensão de Mundo.
O embricamento de gostos librianos foi imediato. Ela adorava o mar, o fogo e o ar. E eu retirava daquela pequena, forças que nem mesmo ela sabe hoje. De família tradicional, sua mãe me confiou toda a guarda dela quando estávamos juntos. E eu fiz jus à semelhante confiança até os dias em que nos desencontramos pela primeira vez. As colônias de férias anuais cessaram, nossos caminhos tomaram rumos diferentes como bem deveria ser aos com diferença de idade tão exacerbada. Em suma, perdi de vista minha irmãzinha por longos anos, arrisco eu uma década inteira.

PIRATA BAR – A SEGUNDA-FEIRA MAIS ALEGRE DO PLANETA

O tempo passou lento como costuma ser. E eu continuei minha vida de trabalho, estudo e leituras fartas. Dela já não havia mais notícias em uma época em que telefones eram postos a funcionar à base de fichas confeccionadas em ferro e a informática nos moldes de hoje nem sequer era sonhada… idealizada.
Também eram poucas as opções noturnas de diversão na nossa Fortaleza banhada pelo Sol. Essa falha de divertimentos foi detectada pelo saudoso Júlio Trindade, um português esperto que por aqui aportou no início dos anos 1990, época em que Beto Barbosa e sua inconfundível Lambada dominavam os palcos brasileiros. Não tinha jeito! Quem quisesse estar de bem com as diversões da cidade, tinha que passar pelo menos uma vez por mês uma noitada de segunda-feira no ”Pirata Bar” para marcar presença e ver amigos de colégio, faculdade e trabalho. Quem tem mais de 40 que não negue suas origens. Risos.
Pois bem, lá estava eu dançando sozinho (um arremedo) ao som do lambadeiro presente – não era o Beto Barbosa – quando olhei para o corpo de baile que assessorava com passos precisos do ritmo (trauma de nunca ter aprendido Lambada), quando fixei melhor o olhar. Adivinhem quem encontrei pela segunda vez? Sim! Ela estava a rodopiar pelo ar leve como bailarina ao som de Belém do Pará. Parei! Sim! Reencontrara minha menina agora em corpo e alma de mulher. Ambiente lotado e eu precisando falar com ela e só sosseguei quando consegui. Peguei telefone, o endereço ainda era o mesmo e ela estava sozinha, sem amor. Marcamos um encontro outro dia, já que naquela noite não daria.
Em detalhes não entro, mas essa segunda onda me pegou na proa e a paixão não pode deixar de se fazer presente. Foram dois anos e quatro meses exatos de uma relação intensa, cheia de amor, atração, conhecimento mútuo e reciprocidade. Eu e ela nos ensinando coisas do dia a dia, trocando carinhos e por vezes farpas, onde tudo corria bem até que forças externas às nossas nos fizeram separar pela segunda vez e de maneira atormentada. Terei perdido naquele 1992 o amor da minha vida? Nunca saberei!

A TERCEIRA ONDA

VINTE E CINCO ANOS se passaram até que nos reencontrássemos. Desta vez eu homem casado e ela uma doce dona de casa – também muito bem casada – morando em outro estado e lutando bravamente em um emprego público para auxiliar e organizar escolas carentes do lugar. GRANDE orgulho em saber que aquele Q.I. está sendo usado de maneira farta e produtiva.
Confesso uma lágrima agora. Mas prosseguindo, está sendo muito bom saber dela – que sempre me fez tão bem – estar feliz no que faz e no que se tornou. Nosso amor de jovens foi salutar e de crescimento mútuo. Aprendemos muito juntos, nos divertimos, nos amamos, deitamos e rolamos.
Nos confessamos ainda atraídos um pelo outro, mas de forma grande e eloquente. Sabemos que não podemos mais ficar juntos nessa vida. Em outra, quem sabe, possamos corrigir os erros e amorosamente termos nossos filhos, herdeiros maiores de nossos sangues librianos. Pois aos Céus tudo é permitido.
Aos leitores aviso: esse texto é íntegro, amoroso, saudosista e confessional. Já que nesse Mundo atual tão cheio de brutalidades ainda existem poetas. Eu sou um deles e me orgulho disso!
UM BEIJO, D! ESSA FOI PARA VOCÊ!

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*Túlio Monteiro - escritor, crítico literário, publica todas as segundas aqui no Evoé! O texto "GRANDE" foi escrito no dia 25.03.2018. Leia também Literatura com Túlio Monteiro.


sexta-feira, 23 de março de 2018

Fraternidade por amoroso exemplo - Kelsen Bravos*

O presente tem nos exigido crescer em paciência, em tolerância, em convivência. Certa feita um irmãozinho bem querido, daqueles ante os quais não se pode exprimir uma ideia sem ponderação, colocou em provação a minha paciência pela forma como questionou o termo tolerância, usado por mim, na abertura de uma reunião para um grupo com quem trabalharíamos em equipe.
 
Tolerância! Que tolerância que nada! O tolerante se acha superior ao outro. Ser "tolerante com" é uma concessão feita ao outro ou a um grupo, a um gênero, a uma cultura! Só concede quem acha estar em situação de conceder, e quem está em condição de conceder, no mínimo, se acha acima do bem e do mal, pelo menos em relação a quem ele dá a graça de receber sua... tolerância. Falou em um quase surto logorreico, num tom de provocação eivado de ironia e irritação. Mais irritado ficava quanto mais constatava em mim atitude compreensiva, abertura e acolhimento da profunda reflexão posta em pauta por ele. 
 
Ora, temos sim um em relação ao outro em determinados assuntos ou contextos um acúmulo de conhecimento a nos possibilitar entender de forma mais ampla um fato e avaliar a situação de modo a compreender o, digamos, erro alheio e com ele ter tolerância e cumprir o ato solidário de lhe favorecer auxílio para conscientização necessária à avaliação e mudar, por si só, para melhor, é claro. Assim interpreto as observações sobre minhas ideias e comportamentos. Afinal quem me critica ou puxa a orelha está a demonstrar o mínimo de consideração por mim. Serei sempre grato a esses gestos. Gratidão, aliás, aprendida por amoroso exemplo.
 
De fato, o meu irmãozinho querido questionava a banalização do termo, o esvaziamento dele e a sua apropriação pelo discurso dominante de tal modo que lhe incrustava um obtuso conceito de indulgência demonstrado pela comiseração de uma classe em relação a outra, de uma casta em relação a outra. Concordo, pois tolerância ou é uma expressão fraterna ou não é indulgência fruto de paciência e geradora de convivência harmônica entre iguais, a despeito de diferentes pontos de vista.


A mais amorosa expressão de tolerância recebi, e ainda a recebo, de meu melhor e maior amigo. Eu era uma criança, um pré-adolescente. Sempre no almoço em casa, puxava com meu pai assunto das leituras e estudos mais recentes. Um dia ele falou algo do qual discordei e demonstrei com fartos argumentos, devidamente referenciados na literatura especializada do tema, o tamanho da "bobagem" falada por ele. Um silêncio denso se fez até ele interromper dizendo-se feliz em ser aprendiz do próprio filho, afinal fora para isso o tanto que dedicara para nos dar condições de estudo e ampla leitura de mundo. Sorriu e me deu aconchegante abraço do qual sinto o forte calor, embora tenha ocorrido há mais de quatro décadas .
 
Desde então, filho e pai, nos falamos como irmãos. Com o passar tempo, por causa da cada vez mais nítida compreensão de sermos todos filhos de Deus, uma reflexão me assoma em quase certeza: somos de fato, todos e todas, irmãos e irmãs, cuja situação existencial coloca uns como tutores de outros, a fim de fazermos evoluir a relação para a plena fraternidade ou sororidade, pois todos e todas somos camaradas, somos iguais e devemos ter respeitadas as nossas diferenças às quais devemos dedicar paciência e tolerância em uma convivência entre irmãos e irmãs. Evoé!
 
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*Kelsen Bravos - professor, escritor, compositor, produtor cultural e editor do Evoé!

quinta-feira, 22 de março de 2018

Apagão. Em meio ao caos, Luz, poesia e solidariedade de Juliana Holanda

Povo do Meu Bem-querer. A mim me comovem velhos e crianças em especial e tanto ou mais atitudes solidárias, de Amor gratuito, a nos mostrar valer a pena existir. Aqui tem um registro de Juliana Holanda de muito Amor e Solidariedade. Ela o fez no FaceBook, ao lê-lo, pedi para replicá-lo aqui tamanha beleza e bem que nos faz. Ela - Luz intensa! -, imaginem!, disse ser uma honra. Agradeci declarando que ela era muita beleza junta. Ao que, respondeu: "grata, de coração, grata aos ancestrais que me nutriam e nutrem de sensibilidade. ... Amanhã vou atrás de Dona Zezé... e ouvir os pássaros". (KB)

CADA VIDA NO PEDAÇO DESSE CHÃO IMPORTA

Juliana Holanda é de Oxum, trabalha na Secult-CE na
Coordenadoria de Patrimônio Histórico e Cultural.
"Apagão. Na parada do ônibus da Praça dos Leões aceno o 286. Sem entender o porquê, entro no ônibus com o trajeto mais longo. Subindo o degrau, agradeci aos Orixás pela escolha correta do dia. Ficaria inquieta dirigindo no engarrafamento, em meio a desinformação, por falha de conexão com as pessoas via redes sociais, e ao caos da cidade sem semáforos por tempo indeterminado. Ficaria a mercê das emoções e da lei dos homens. Como seria?
Sim, foi correta. Fiz a melhor opção: ônibus. Na mochila, o livro O que é Lugar de fala, da Djamila Ribeiro, do qual acabaria relendo algumas páginas. Na orelha do livro, Sueli Carneiro, registra:


Djamila nos brinda com a organização dessa bela e inspiradora coleção - Feminismos Plurais - na qual se expressa e afirma a diversidade da temática e de perspectivas que atravessam a reflexão, ação política e cultural de mulheres negras, indígenas e homens negros que trazem em comum a insurgência desses grupos subalternizados frente aos modos de subjetivação consagrados pelo racismo, sexismo e o desafio de construção de novos imaginários restituidores da plena humanidade de todas e todos.

Penso que desejo ainda compartilhar a leitura e discussão com tantas pessoas. A todo momento, entretanto, ouvia comentários sobre o possível motivo da falta de energia. ... 'culpa desse governo doido, sem pé nem cabeça' - dizia um usuário. Concordei com a desaprovação do rapaz que em seguida tiraria o fone tentando serenizar a sequência de más notícias dos últimos tempos. 

Já no terminal do Papicu, as selfies no breu traziam uma sensação de ineditismo. Como não registrar na memória a existência no meio do caos? Pego outro coletivo do qual desço na parada de ônibus da Cidade 2000. Percebo uma senhora, que parecia ter no máximo 1,40m, bolsa agarrada na axila (atitude e costume dos antigos) e a fala trêmula. Ela tentava dar um passo a mais. Não conseguia distinguir o calçamento e a calçada. Pior foi perceber que Dona Zezé não sabia para onde ir.

Antes de alcançá-La, ouvi recomendações de outros pedestres... 'Vai devagar'... naquela altura, insensíveis, insensatos e sei-lá-mais-o-quê pois não notaram a idade nem fragilidade daquele corpo franzino. Como essas pessoas não ofertariam ajuda? Se sou mais uma - e desço correndo sem perceber ao meu redor - como Dona Zezé ficaria? Coração aperta. O grisalho do cabelo Dela estava vistoso. A partir de então, éramos nós duas, de mãos dadas, pisando o chão sob a luz da tênue lua e das estrelas.

- Está nova. - dizia Ela olhando pro céu.

Mostrei as Três Marias da constelação de Orion, única que saberia identificar. Ela me chamou de Anjo. Respondi que eu era bem Pretinha. Ela riu, disse que não tinha preconceito e que torcia que existissem mais anjos pretos pelo mundo, só assim as pessoas entenderiam que somos iguais. Estava abraçada pela Sabedoria, sorrimos novamente.

Fui contando a cada quarteirão onde estávamos, dizendo o nome do comércio, detalhando a passada naquele contato surgido pela urgência. O ato a fez recordar das vivências pelo bairro. Caminhamos ainda uns quatro quarteirões até chegar a entrada de sua rua. Disse:

- Estamos perto da loja dos pássaros. 
- Entremos aqui, é por aqui mesmo, eles cantam que é uma beleza, venha pela manhã ouvir. - respondeu.

Recomendação anotada. O número da morada é 266 e chamo pela Dona Graça. Escuto o arrastado da chinela e um 'Graças a Deus, Dona Zezé!' é dito lá dos fundos. 'Minha fia, Deus te abençoe!' Respondo o de sempre: asé e a todos nós.

Dona Zezé aperta meu braço e diz. 'Que teu Deus te faça feliz' e afirma que pode ser minha bisavó. Sobe a calçada e entra aliviada pela chegada em segurança.

Estendendo a bênção, oro sim aos meus Deuses Xangô, Yansã e Obá para proteger nossos caminhos, na cidade e no interior, em especial a todas pessoas 'desassistidas', em especial nas periferias, nos quilombos, nas aldeias desse nordeste noturno sem luz. Cada vida no pedaço desse chão importa."

quarta-feira, 21 de março de 2018

Efes - Chico Araujo*


Mal entrou no recinto, foi obrigado a ouvir a invocatória:
- Ei, Filé-de-Borboleta.
Não se aborrecia mais, acostumado com o epíteto desde quando adolescente: cresceu muito, porém somente esticou, sem engordar nem receber sobre os ossos massa muscular que o deixasse naquele padrão reconhecido como o das pessoas com peso ajustado ao tamanho.
- Diz, Ferrado – foi a resposta que deu, sem que para ela houvesse qualquer crítica ou aborrecimento. Filé e Ferrado se conheciam há muito tempo, cresceram juntos, eram quase irmãos, não se aborreciam com a maneira como se tratavam.
Onde morava o Filé-de-borboleta, muitos o tinham como um sujeito fajuto, mas tenho cá as minhas dúvidas; creio que essa suposta fajutice se devesse à ausência de proximidade dele, à falta de conhecimentos sobre ele. Acho mesmo que o grande mister – e problema – dele era a compulsão para falar água. E como falava! Ah, como falava... Mas bem sei que algumas vezes acertava em cheio naquilo que falava.
Talvez sua maior questão estivesse no fato de querer saber de tudo, entender de tudo. Aí, dava no que dava. Falhava naquela eterna falação fácil, feroz às vezes, noutras por intenso frivião – muitos debochavam. Ferrado sempre o defendia, pois reconhecia no amigo total ausência de maldade, de intenção de ser falso. Falava porque falava; parecia ter nascido para isso. E ele também reconhecia que nem sempre o Filé falava absurdos.
O fato mesmo é que ele falava muito e ninguém conseguia parar sua língua quando ele aparecia com ela solta. Aí cansava os ouvidos, às vezes até irritava-os pela altura e estridência da voz constante. Como dizem muitos, ele “metralhava” suas conversas, cortava o turno de fala das pessoas, discordava, concordava, apresentava suas opiniões, depois as contradizia... Era assim, impetuoso na ação de falar.
Também tem uma: não era amigo de fuxico. Isso não. Ninguém dissesse que ele fuxicava que ele ficava fulo. E também não gostava de futrico (a menos que a situação pedisse); só gostava de falar falar falar falar... E assim corriam seus dias, em muita falação, também em quase total tranquilidade.
Até o dia em que precisou ficar no mesmo ambiente em que se encontrava um certo Carlão, aquele deputado que se imiscuía em várias situações a partir das quais pudesse ser visto para, no fim, ficar conhecido. O problema não estava exatamente em ficar no mesmo ambiente (já acontecera outras vezes), posto que o Filé sabia conviver com as pessoas; aquele conflito se iniciava com o que dizia aquele representante do povo.
O deputado já estava criando o hábito de aparecer muito no “Bar do seu Luís” e, para impaciência de boa parte da freguesia de há muito, levando em sua companhia pessoas de seu naipe ou próximas dele. Em outras palavras, aquele político estava contaminando o “Bar do seu Luís” com sua presença, com a de pessoas “suas”, as suas conversas, suas gargalhadas, sua busca de conquista do povo dali. Para muitos, não deveria ficar ali de flozô – mesmo garantindo ao seu Luís um reforço no caixa –, mas em Brasília, trabalhando de verdade em benefício do povo.
O Filé-de-Borboleta não ia nem um pouco com as feições daquele político e também não fazia nenhuma cerimônia de deixar bem clara essa sua posição. Cumprimentar, até cumprimentava, que podia ser “Filé-de-Borboleta”, mas não era mal-educado. Ser amigo, ter grande proximidade, aí já seria demais.
Pois naquele quase meio-dia daquele sábado de temperatura agradável o tal Carlão, acompanhado dos dois fiéis assessores também já se acostumando a frequentar o “Bar do seu Luís”, entendeu de dizer alto e bom som haver tramitação, na Câmara, de projeto de sua autoria que iria colocar aquela cidade no mapa do mundo. Todos os presentes olharam para aquele astuto representante de causas as quais dizia republicanas. Seu Luís não somente olhou:
- Que projeto? Que mapa de mundo? Nossa cidade vai muito bem, obrigado.
- Mas pode melhorar, né, seu Luís. Aliás, ela vai melhorar. Meu projeto está sendo muito bem compreendido pelos meus pares lá em Brasília.
- E o que os seus pares lá em Brasília tem a ver com nossa cidade? O que o senhor mesmo tem a ver com ela, se nem daqui o senhor é?
O camarada deu um sorriso que foi impiedosamente filmado pelas retinas desconfiadas do comerciante.
- É que eu já me sinto um filho dessa terra maravilhosa, seu Luís, essa terra que acolheu a mim e a minha família muito bem. Preciso retribuir e a melhor maneira de fazer isso é trazendo mais progresso pra ela. Ela está em ponto estratégico nesse Estado maravilhoso e o que eu puder fazer para melhorá-la eu farei.
Houve um silêncio incomodador. Seu Luís botou os olhos firmes em cima do deputado, dizendo de si para si: Fuleiragem. Filho de uma égua.
Quem não ficou calado foi o Filé:
- Fantasia. Fanfarronice de falastrão.
- Como é, Filé?
- Isso mesmo. Desde que chegou aqui é isso. Fala, fala, fala e nada. Não se vê nada. Dizem aqui que eu falo demais, mas o senhor é fábrica de falácias. Eu falo muito mesmo, mas eu sei o que falo. Eu falo porque sei, sou inocente não. Falo porque tenho o que falar e com justeza. Outros falam no vazio, falam só por falar. Projeto? Que nada. É só falação isso. Eu fui futricar na história do senhor ali na Câmara e não vi nada. O senhor nunca falou nada, nunca apresentou proposta nenhuma. Tô aqui lhe fustigando é pra saber se o senhor fala de uma futurição exata, ou se está dizendo coisas como futurista impreciso e esnobe. Cadê o projeto? Mostra. Faço que nem São Tomé: quero ver. Ver para crer. O senhor deve tá é fazendo fuzarca com o povo daqui. E tem mais: quem disse que o povo daqui quer esse progresso que o senhor tá falando? A vida aqui é boa, muito boa, tranquila, pacífica, honesta... ou pelo menos era até o senhor vir pra cá.
- Aí você já está ofendendo, Filé. Não sou fuzarqueiro, não. Quero o melhor para nós todos. Vim pra cá porque aqui é um lugar muito bom – disse isso piscando um olho para um dos assessores ali com ele.
No Bar, o silêncio especulativo de como aquela conversa ácida iria acabar. Seu Luís olhou para o Filé como quem pedia para ele controlar a língua. Mas ele ainda foi um pouquinho mais adiante:
- Tomara que o senhor não desonre nossa cidade com alguma farra de milhões. Muitas coisas que muitos de vocês fazem e que deveriam ser festa facilmente se firma como fuzuê. O que deveria ser feito com finura, elegância, honestidade acaba como atestado de fisiologismo.
Filé, enfim, se calou. O olhar dele firme em encontro com o olhar do deputado. Enquanto se miravam, se mediam, seu Luís observava os dois, enquanto passava um pano por dentro de um copo de vidro, enxugando-o. Os frequentadores do Bar que por lá estavam permaneceram em silêncio, mas num formigamento de curiosidade que observava tudo esperando o desenlace daquela contenda.
Decerto uma fissão ocorreu ali. E foi intensa e tensa.
E preciso confessar: fiquei fissurado para saber da realidade do projeto. Seu Luís também. Acho mesmo que todos que estavam lá. Talvez até o deputado e os assessores. Para que tudo não passasse de simples fita; para que todos, no futuro, pudessem entrar em verdadeira e honesta festa. Festa fabulosa, sem ser desagradável fábula.
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*Chico Araújo -
professor, poeta, contista e compositor, publica toda quarta-feira no Evoé! O título "Efes" compõe o Abecedário de Crônicas do Evoé e foi escrito entre 12 e 17 de março de 2018. Leia mais Chico Araújo em Vida, minha vida...

segunda-feira, 19 de março de 2018

FERROVIÁRIO ATLÉTICO CLUBE - Túlio Monteiro*

EU TIVE UM SONHO! Não, não estou me referindo à famosa frase de Martin Luther King, que lutou até o dia de seu assassinato, no dia 4 de abril de 1968 (50 anos passados), contra a segregação negra nos Estados Unidos da América, por que não dizer do Mundo.

Refiro-me mesmo ao sonho que tive noite anterior com o Tubarão da rua Dona Filó, 650 – Barra do Ceará: O Ferroviário Atlético Clube, sabidamente o segundo time do coração de todos que torcem pelos grandes elencos do nosso estado, ou seja, Ceará e Fortaleza. E não me desmintam aqueles que no mais íntimo de suas almas não têm uma quedinha pelo nosso amado “Ferrim”. Estarão a blasfemar! Risos.

Pois bem! Mas vamos ao sonho, que pela segunda vez o tive em alguns anos. Já que em meu livro de contos, “Dois dedos de prosa com Graciliano Ramos” (2007), narrei o evento de uma disputa histórica entre Ferroviário e Machester United com o único de intuito de tirar uma onda com o poeta, contista, mestre em Literatura Brasileira e ferrenho defensor do “Ferrão” Chico Miranda, hoje já falecido.

Desta vez o onírico foi mais real, uma vez que, qual fênix, o Ferroviário está renascendo das próprias cinzas e dando ares de retorno imediato ao plantel dos grandes das terras de Alencar. Sim! Isso mesmo! Para os menos avisados e antenados, o Gigante da Barra vem trucidando adversários de cá e de fora qual moedor de carnes, de tão redondinha é a pelota que vem jogando.

Pois bem, acordei assustado com o resultado de minhas memórias do sonho, uma vez que simplesmente o “Ferrim” acabará com a máxima de só ser campeão cearense de nove e nove anos ou em ano terminado em nove. (A última conquista, contudo, foi em 1999, pasmem!). Em meus embalos na rede de deitar, adormeci e começou tudo: primeiro o Tubarão da Barra arrasou e ganhou o campeonato cearense de forma invicta, goleada sobre goleada. Fez o mesmo na série B do Brasileirão e subiu para a primeira divisão do Campeonato Brasileiro no mesmo ano.

Daí para a classificação da Libertadores da América foi só um pulo. Agora, nem o maior dos torcedores podia imaginar que, contra um time argentino cujo nome me falha agora, o “Ferrão” se sagraria campeão da Libertadores da América, com direito a passeio em carro aberto e aeroporto lotado de todas as camisas de times que possam ser imaginadas sendo orgulhosamente vestidas por torcedores mil, numa confraternização que em nada lembra as atrocidades que vemos em torcidas organizadas planeta afora.

Sim, meu caro leitor, o Ferroviário iria disputar o campeonato mundial de clubes de 2019. O tempo passou e com os cofres cheios e uma boa administração os reforços começaram a chegar. Sendo o ano de 2018 dedicado exclusivamente à reforma da sede, contratações a peso de ouro, campeonato cearense (mais uma vez vencido por você sabe quem) e amistosos internacionais.

E dizem que em time que está ganhando não se mexe. Mas essa máxima do futebol não se aplica aos clubes que crescem de maneira avassaladora. E o time composto por uma senhora comissão técnica e jogadores do porte dos goleiros Léo e Maílson, dos zagueiros TÚLIO, Cristiano e Erandir, dos laterais Amaral e Sávio, e dos atacantes Roney, Mota, Luís Soares e Romário foi aos poucos se desfazendo em detrimento de jogadores de nomes internacionais, alguns até da seleção brasileira.

O 2019 chegou e com ele a decepção de mais uma Copa do Mundo da FIFA perdida vergonhosamente na Rússia no ano anterior. Para compensar e lavar nossas almas, estava o Ferroviário remodelado e polido ao esmero,  nos Emirados Árabes Unidos. E para quê? Para disputar – de igual para igual – o Campeonato Mundial de Clubes com ninguém menos que o Barcelona de Messi, Luizíto Soaréz e companhia. Ressalte-se que o clube adversário se reforçou com os melhores de cada time para ter chances contra o Ferrim, estava assim uma Seleção do Resto do Mundo para enfrentar o portentoso Tubarão da Barra.

O Brasil parado em frente de suas televisões, os mais abastados acenando com suas bandeiras e camisas no estádio lá nos Emirados Árabes Unidos. No Céu, Chico Miranda atracado com São Judas Tadeu, ambos lideravam a imensa torcida de lá. Por ser o Ferrim expressão da Paz, os países signatários da ONU decretaram feriado nacional. E os times entram em campo.

Lembro que até camisas do ”Ferrão” eu comprei para toda a família. Televisão ligada, olhos sem piscar, o juiz apita o início da peleja. Viv´alma nas ruas não existiam, que não nos bares a exibir a contenda. Aquela, sim, ia ser uma decisão de Copa do Mundo.

A essa altura você já deve estar curioso com o resultado do jogo e eu, creio, também nunca vou saber, pois fui arrancado do sonho por buzinas e gritos. Fiquei possesso, esbravejei comigo mesmo e com os deuses dos sonhos. Até para o anjo-da-guarda sobrou. Por que me deram um sono tão leve?! Fui à janela começar uma guerra; mas no caminho ouvi nitidamente os gritos de Ferrim! FERRIM! FERRIM!

Ao abrir a janela, vi o cortejo coral em festa. Seria o campeonato mundial? Não... não dormira tanto assim... depois soube estar o Ferrim entre os oito melhores clubes da Copa do Brasil... eis o porquê da festa. Associei um fato a outro, seria o sonho um prenúncio? Tomara que sim, sonhar, enfim, não custa nada e o recado fica dado: pode até ser que o Ferroviário não venha a chegar a tal feito, mas que o time que hoje atua pelos gramados do País está de encher os olhos, ah está. Acompanhem! Torçam! Surpreendam-se com o nosso Tubarão da Barra. Até a próxima. Risos. E façam vocês mesmos o placar final entre Ferroviário e a Seleção do Resto do Mundo.

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*Túlio Monteiro - escritor, crítico literário, publica todas as segundas aqui no Evoé! O texto "Ferroviário Atlético Clube" foi escrito no dia 18.03.2018. Leia também Literatura com Túlio Monteiro.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Estudantina - Kelsen Bravos*

Queria ficasse assim uma paratopia, que se materializasse sempre pelo desejo dos encontros boêmios. Adoro música. Música de violões e voz em mesas de bar, em quintais, regadas pela emoção dos olhares, sorrisos, papos e abraços. Sem hora para acabar e quando o momento de separação surgisse fosse em forma de até já.

Houve um tempo por aqui de ser bem comum encontrar espaços assim, depois os violões sumiram. Talvez pela imposição da necessidade de feijão de quem vive o sonho de ser músico. Talvez não. Bem sei da falta em mim desse canto acompanhado de alegres ou plangentes pinhos.

Foram desse jeito os anos de 1980 até meados dos 1990, uma transição entre o ressurgir das canções espontâneas em bares e praças (a festejar o sol e o luar da abertura política e o início da redemocratização no país), e o recolher desse ímpeto luminoso do canto liberto, dando devido lugar a apresentações profissionais dos músicos de banquinho e violão em bares e restaurantes, com as cobranças dos merecidos couvert artísticos nas contas. 

Num rápido exercício de memória desse tempo, a lembrança me leva ao Bar das Letras, ao Jazz Blues Bar, ao Quina Azul, ao Bar da ASAUFC, ao Recanto do Sabiá (do meu amigo Rainunes), ao Mila Lanches (academia paralela - não havia apresentações pagas, só o violão do Tarcísio Câmara), todos no Benfica. A ordem em que cito os lugares não é a da cronologia do surgir e sumir os bares (porque aqui tudo é efêmero).

Lembro dos efêmeros Cio da Terra, Cheiro Verde, Tom Bege, Bar da Filosofia, esses dois últimos vicinais à Faculdade de Filosofia de Fortaleza, onde conheci meu amigo Lira Neto no comecinho dos anos de 1980. Quem nos apresentou foi a Dudu Molotov, codinome definido por Airton Monte à nossa amiga poeta e acadêmica de filosofia, contemporânea do Lira, da Sônia Maria Castelo Branco, da Martha Vecchia, da Sandrinha, do Ellis Mário e tantas outras (Clara Pinho) figuras bem queridas.

Havia o Cais Bar de tantas histórias, o Largo do Mincharia, e tantos pela Praia de Iracema. O sempre que não fechava Tocantins, onde todos boêmios vindo de todas as demais tabernas se encontravam...

Lembro do Mesa de Bar, do Papo de Esquina (sonho fugaz de meus irmãozinhos Celso e Severo), esses no roteiro do PCdoB (Polo Cultural do Benfica). Neles a paratopia boêmia existia. Nenhum, porém, era igual à Estudantina. Junte a qualidade de todos os bares citados em um só lugar, eis a Estudantina. Era uma varanda de uma casa caiada decorada com simplicidade na forma e requinte no conteúdo, lugar tão aprazível estou para ver igual.

O aconchego do lugar tem a extensão do espírito de Leda Guimarães Rocha e Ignácio Barreira Rocha. O sorriso da Ledinha, sua doce voz, a atenção no ouvir e a palavra amiga plena de carinho a nos querer fazer botar sentido na vida. O abraço de coração imenso, sorriso largo e solidariedade sem par do Ignácio transforma o espaço em bar doce lar.

Nem parecia mesmo um bar; de fato, não o era, pois ao adentrar a Estudantina atravessávamos um portal para felicidade boêmia. Shows, saraus literomusicais, conversas mil sobre filosofia, literatura, projetos, notícias de jornal (não havia televisão por lá), num ambiente de excelente repertório musical. As caixas de som em volume suficiente para não atrapalhar o papo falando da vida. As separadas e diversas mesas iam-se acoplando umas a outras com o passar das horas até se transformarem numa única távola boêmia. Conheço muita gente de lá. Amigos admiráveis e muito queridos. Luciano Franco, que presente maravilhoso a Estudantina me deu!, assim feito o Cláudio Costa, Fhátima Santos, Humberto Brito...

Testemunhar a arte de João Barbosa e Paulo Barreto a inaugurar a programação de shows do espaço cultural não foi coisa pouca. Um misto de erudito, do primeiro violino da sinfônica da Paraíba, e de popular, da radical expressão da voz e violão do hoje Cumpade Barbosa. Espaço Cultural Edson Távora assim foi carinhosamente batizado  de forma não oficial por Ignácio e Leda, em homenagem póstuma ao músico que sempre frequentava a Estudantina no meio da semana. Certa feita, me conta Ignácio, Távora recebeu um acordeon importado e fez questão de inaugurá-lo numa noitada por lá. Um encanto.

A programação, claro, teve sequências em muitos espetáculos, Késia (en)cantou por lá minha preferida Catavento e Girassol, de Aldir Blanc e Guinga, ("só você me pede essa música, Kelsen, eu adoro." - disse-me uma vez). O mais marcante foi o dedicado a Vinícius de Moraes, em que Fhátima Santos e sua voz de silenciar catedrais, acompanhada de Cláudio Costa, violão, Luciano Franco, baixo, Dihelson Mendonça, teclado-piano, com leitura de texto por Ricardo Guilherme... e outros atrevidos feito eu.

Tanto talento junto só me confirma a existência de Deus, e o quanto Ele ama a arte, pois era Divina tamanha beleza a reverberar por lá em música, em texto, em canção, em poesia e nos encantos dos encontros de nós com nós mesmos e com os outros.

Deus, aliás, tal qual me lembra Ledinha, que um dia pacientemente tentei explicar para minha querida amiga Inês não se tratar de um senhor bem velho e barbudo. Isso já às cinco da manhã... Deus sim que me fez protegerem da queda ao descer dos batentes da Estudantina. Juram a Ledinha e os demais terem visto na queda minhas pernas e pés, em vez da cabeça, sobressaírem para além e acima do muro. Todos correram para ver na calçada o estrago. Os recebi com a frase: "capoeira não cai, mas se cai, cai bem..."

Não havia só música, muita literatura também se vivia por lá. Túlio Monteiro outro dia me falou ter sido na Estudantina onde acertou com o Lira Neto a proposta para publicar o perfil biográfico de Lopes Filho. Aliás, muitos projetos editoriais o Vessillo Monte e o Lira conversamos ali, quase todo o santo dia, em companhia de Jota Pompílio e Edvaldo Filho. Lá testemunhei casamentos e desenlaces, enlaces e enrascadas amorosas e muito prazer e muita dor... eita! Intensa dor.

...

Mas o melhor de tudo era o após o hiato entre a despedida dos, digamos, normais e a chegada dos boêmios mais noctívagos a surpreender os que ficávamos. Vinham com conversa animada como se tudo estivesse começando agora e logo, espontaneamente, sacavam os instrumentos, violões, baixo, sax, flauta e começavam a preencher o ar e a vida com as mais belas músicas e poesias das canções até depois do raiar do dia. Numa dessas estavam reunidos, entre outros, Luciano Franco, Arismar do Espírito-Santo (companhia), Ellis Mário, Cláudio Costa, Fhátima Santos, Dihelson Mendonça e seu teclado e muita poesia na voz de Ricardo Guilherme, Karlo Kardozo, Eugênia Siebra, Suzi Lins, Ignácio, Ledinha, canora, e a nossa voz.

Quero de volta tudo outra vez, não só a Estudantina; mas o tempo da delicadeza, em que o silêncio das noites e madrugadas era preenchido pela poesia das canções e a juventude era poupada do vexame de morrer tão cedo. Ave Estudantina! Evoé!


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* Kelsen Bravos - professor, escritor, compositor, editor do Evoé!

quinta-feira, 15 de março de 2018

ANOTAÇÕES ANTES DE CHEGAR AO MAR ... - Carlos Emílio Corrêa Lima*

Os primeiros indícios das emanações dessa região de Java vieram-me num sonho onde ecoou como uma ostra perturbada por si mesma a frase sem cordéis, solta no espaço: “Java comeu seu cavalo.”

Esta região da grande ilha (dizem ser esta ilha na verdade um pequeno e velho planeta caído há milhares de séculos no Oceano Pacífico) era dedicada ao culto dos dragões e dos antepassados. Uma região demorada onde o tempo esculpia variações desconhecidas de colinas e de si mesmo. Dizem os primeiros relatos gravados pelos etnólogos da escola dinamarquesa que foi precisamente nesta área bem ao norte da ilha que canta com todos os seus minerais silenciosos, que aquela Terra chegada aqui nessa camada do universo pariu os primeiros seres humanos. Aqui, neste lugar em que escrevo, os avós de argila das atuais oleiras que vendem nas ruas meândricas da vila suas esculturas mitológicas bafejadas pela encosta da montanha cujas formas não têm equivalência nem se repetem musicalmente em nenhuma outra parte de outras ilhas da Terra, nos pátios desta cidade, essas mulheres que sempre se vestem de vestidos vermelhos, que vivem reclusas, oleiras cantoras mágicas, que quase jamais saem da sombra dos imensos e curvos telhados em forma de dragões trançados estilizados de palha, bambu e madeiras exceto em dias de feira, dias que parecem extremamente cavados e equilibrados pelo sol. Os maridos delas, seus irmãos, os cunhados, seus filhos e os pais deles também, todos eles, não sabem encontrar essa argila especial, retirá-la das garras invisíveis da terra, soprar sobre ela palavras evocadas do princípio, mover e moldá-la, para manifestá-la. Somente elas, que descendem da parte mais funda da cratera por onde os homens e as mulheres que depois as geraram foram paridos pela terra que caiu do céu, essa terra de montanhas de jade e borboletas gigantescas, verdadeiras tendas vivas aéreas, que trouxeram as cores, as frequências, aragens e presenças indissolúveis que ainda não existiam na Terra no oscilante e pulsante passado, somente essas mulheres sabem destas histórias entoadas também pelos ventos nas pontas dos istmos mais avançados sobre o mar, muitas já completamente perdidas não fossem as esculturas linguísticas que elas disseminam no espaço quando cantam seus versos vibratórios sobre os veios dizentes e secretos dos solos argilosos de onde extraem toda a força e os movimentos de suas mãos e seus gritos-filões, imensos alaridos de modelagem que transportam em coro quando descem da montanha com as massas úmidas e fortes extraídas do silencioso interior do território que veio do mais alto veio de diamante do céu num comprido rio de ruídos de cristal cadente que ainda reboa e ressente-se em toda as partes cientes tácteis do universo .

Antes do escaneamento dos anais da Sociedade Etnológica Dinamarquesa não havia sido notada a lacuna deixada por dois volumes da revista da entidade, que agora encontram-se na velha estante helicoidal em forma de serpente da biblioteca do monastério astronáutico, que é um transatlântico brancamente vedado que jamais ancora nos portos das ilhas ou continentes. Nele, neste navio mantido isolado em algum ponto desconhecido do Oceano Índico preservam-se em segredo todos os registros dos mitos da velha humanidade derrotada, mitos que não podem mais ser sabidos, relembrados, tinidos, bigornados, faiscados. Foram mais de trezentos pequenos planetas e retorcidos volumosos asteróides (ostras-meteoros com suas pérolas mentais dinamando suas reentrâncias radioativas tonais) que desabaram em sucessivos-simultâneos momentos em muitas partes do quase infinito gelatinoso mar primicial, cuja tonalidade e conteúdo não era da consistência e essência desse azul escuro e esverdeado rumoroso de agora. Esse novo mar atual é um novo tipo de sangue geral de diferentes salinidades, densidades, velocidades e profundidades que se prepara para seres ainda mais desconhecidos e reversivos que ainda não foram criados nem gerados nesse mundo, mas que era então de um sangue marítimo cetáceo manifesto bem mais anterior e recessivo, quando ainda não haviam sequer seres para ele , que ele neles vermelho circulasse, se infiltrasse, seu líquido habitante, que tal proeza márgica fosse fenômeno assim somente então para o tempo mais adiante, quando da multiplicação dos corpos. Tudo ainda não era este nosso atual futuro, futuro de hoje, do tempo presente, o mais distante e veloz de todos os futuros, que aqui passo a relatar, futuro à Leste de tudo. Acabrunhado e atônito, fugi das cidades desnucleadas onde ficara muito tempo estonteado diante de metais intensíssimos, lisos e prontos para serem ocupados pela mente geral, arrancados que foram também à mais remota escuridão, mas os quais destinam-se ao desvio de nossa atenção para assuntos muito distantes, sem vinhos das lendas das ilhas imensas , ilhas todas que caíram do céu, ilhas de jade, tório, ferro, molibdênio e granito com os seus grandes estampidos-invólucros, as grandes histórias-maremotos e suas flores-território, flores-oceânicas, templos de quedas colossais, fugi dessas cidades para sempre.

Java terá sido o primeiro planeta-escultura a cair sobre o universal mar de hemoglobina, o mar de púrpura de antes da existência dos seres, submarinos, terrestres e aéreos, e de todos os homens - e de suas navegações - pois nada vivia e flutuava de qualquer modo e intensidade sobre ele, ele ainda era totalmente exterior, vermelho e total, líquido da vida geral, à espera da queda orquestrada de todos os meteoros e planetas de ouro sobre ele, um ser escutando infinitamente espumoso a chegada das clavas celestes, das ilhas que cairiam do céu. Java foi a primeira a cair, a ilha que canta para o mar escarlate anterior, quando nele mergulha. A ilha que fendeu e fecundou o plasma original. Solidificantou-se ainda mais (pois com o impacto não chegara a se fragmentar), do alto proclamada. Ilha astral ajustada ao mar, o qual foi mudando de cor desde então, quando ferido em muitos de seus pontos por todos os meteoros, que foi se azulando em lentamente remota gradação. Ao que, dessa ilha-meteoro, por uma estranha rachadura em sua superfície, brotaram os primeiros seres móveis viventes, que, saídos da gruta-mãe, da cachoeira, se adentraram através dos rios, na sua floresta.

São essa esculturas cantadas que vejo ritualmente agrupadas nas platibandas dos mercados das pequenas vilas de ruas meândricas nas encostas da grande montanha da ilha de Java e que vou trocando por diminutas ostras com estas mulheres atentas. Dizem que esses cantos-esculturas ressuscitam os cavalos e que alimentam diretamente as estrelas. Antes que elas novamente caiam sobre o grande mar, dessa vez de agora, temporariamente azul, da Terra.

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*Carlos Emílio Corrêa Lima - contista, editor, crítico literário, mestre em literatura pela UFC.

quarta-feira, 14 de março de 2018

NOTÍCIA: Café com Poesia no CEJA José Walter - 2108 apresenta a eterna poesia de Belchior

O CEJA José Walter realiza mais um Café com Poesia, na edição deste 14 de março de 2018, faz homenagem ao grande rapaz latino-americano Belchior. Uma iniciativa da responsabilidade do Grupo de Linguagens e Códigos com apoio do Núcleo Gestor/Saps e todos os professores, funcionários e alunos da escola em mais um evento da "Arte na Educação como meta para nossa ESCOLA DIFERENTE".

A programação traz nomes emblemáticos da cena cultural. Palestras, saraus, bate-papos, um evento, sem dúvida, de alto nível, digno do homenageado e do público. Merece ser replicado em todos os lugares. Confira:

 PROGRAMAÇÃO

Manhã - 9 h

Palestra:

TEMA: Diálogos poético em A Palo Seco
Profa. Kelly Medeiros (Mestra e doutoranda em Literatura Brasileira - UFC)

Participação Musical
João Barbosa (músico, cantor, menestrel)

Café Especial (Espaço de Convivência)
Momento de divulgação de livros e cds dos autores


Tarde - 15 h

Palestra:

TEMA: O poeta Italiano Dante Alighieri e a Divina Comédia Humana na obra de Belchior

Sarau literomusical com Ricardo Kélmer - jornalista, escritor e agitador cultural
Autor e organizador do livro Para Belchior com amor

Participação Musical
Alexassandro Santos (músico, artesão e poeta)

Café Especial (Espaço de Convivência)
Momento de divulgação do livros e autógrafo dos autores
Noite - 19 h

Palestra:

TEMA: Um depoimento apaixonado pelo coração selvagem do ídolo Belchior

Cleudene Aragão - doutora em linguística, professora da UECE, gestora cultural e escritora.
Autor e organizador do livro Para Belchior com amor

Participação Musical
Antônio Carlos Lima (funcionário administrativo e nosso Tom Jobim)

Café Especial (Espaço de Convivência)
Momento de divulgação do livros e autógrafo dos autores presentes



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