terça-feira, 28 de agosto de 2018

Sem confetes - Chico Araujo*

Dos poemas de Túlio Monteiro constantes nessa antologia, “Poesia” tem natureza metalinguística. Nela, o poeta declara a seus leitores o que a poesia significa para ele: um espaço de expressão no qual as palavras são costuradas com o propósito de dar voz a um eu lírico múltiplo de vivências e sentimentos. Isso é o que depreendemos dos dois primeiros versos; dos quatro últimos, o desnudamento de certa ansiedade positiva para a escrita de seu mundo interior.

Por isso, acolhemos a poesia de Túlio Monteiro como meio de revelação, muita revelação. Por meio dela, um eu lírico expressa, expõe, põe à vista do leitor latências incontidas. A partir dela, esse eu lírico faz transbordar, principalmente, sentimentos e sensações já não possíveis de contenção.

Desejo, lembranças, paixão, saudade, dores, solidão são elementos formadores de suas temáticas em exploração poética, em versos compostos em linguagem simples, o que permite aos leitores interação rápida com sua poesia, mesmo nos momentos de maior sutileza expressiva, quando nos deparamos mais intensamente com sua subjetividade.

Em “Teus olhos no vinho”, por exemplo, os dois primeiros versos expõem ao leitor um momento em que o eu poético declina um momento de recordação e, devido a ele, o despertar de uma saudade em amplitude tanta que a lembrança dos olhos da pessoa querida e desejada perduram em seu rememorar, pois “teimam em boiar / no escarlate do vinho”. Vê-se, nesse instante, o registro de validação de alegria, posto que, devido a ele, “Um sorriso franco me chega ao peito / feito feitiço em noite de lua cheia...”.

A imagem da pessoa amada nesse poema é tecida, subjetivamente, como prazer, encantamento e felicidade a partir da utilização de palavras e expressões como “sorriso franco”, “feito feitiço em noite de lua cheia...“ (aqui se deduz a grandeza da pessoa amada, posto que associada à dimensão subjetiva proporcionada pela lua quando está cheia), “saudade do teu carinho”; no entanto, a dubiedade dos sentimentos também é pronunciada quando emerge alguma tristeza pelo distanciamento do ser amado em “nunca mais te terei / ao alcance de meu beijo.”.

Em “Saudades das estrelas no corpo” e “Há pó de estrelas pelas estradas”, lembranças e saudades dão vazão a sentimentos de paixão que transitam pelo padecimento do amor sentido e pelo prazer lembrado, porém perdido. Os versos “Um tempo nunca mais retornado / Relembra a paixão e o viver.”, do primeiro, dizem bem de uma lembrança em recorrência no existir do eu lírico, uma insistente lembrança que não maltrata, pois significa vida. O amargor da saudade, contudo, aparece nos últimos versos desse poema, quando se fala do amigo que foi embora, do tempo que não pode retornar, do “grande amor” agora inalcançável.

O segundo, logo em sua primeira estrofe, expressa experiências sentimentais saudosas e alegres, uma vez que “o pó de estrelas pelas estradas” é motivo de prazer que leva a uma sensação de espírito pacificado. Essas vivências são despertas novamente por lembranças, posto que vindas dos “últimos já quase oito anos.”, tempo em que a experiência amorosa foi pretendida para um sempre, ao serem considerados os versos “amantes que, mesmo antes de tê-las, / já éramos antes, hoje e depois.”. Essa vivência amorosa do eu lírico está sempre marcada por momentos de amor partilhado e, depois, pela solidão do amor rompido, mesmo que essa solidão emerja não a partir de fatos, mas de temores pela perda. É o que se intui dos versos “Tantas lembranças dessas estradas / estão retidas em minha mente / tão temorosas de serem lembradas / por medo que o peito não aguente / todas as dores de amor geradas / pelas ideias de te ver ausente.”

A poética de Túlio Monteiro também pontua acentos de Intertextualidades, como, por exemplo, em “Saudades das estrelas no corpo”, uma vez que a última estrofe retoma, em parte, frase e estrutura poética de Casimiro de Abreu em “Meus oito anos”. De modo semelhante, no mesmo seu poema, Monteiro, por intermédio do eu poético, associa versos da música “Como nossos pais” – exatamente “... já faz tempo eu vi você na rua / cabelo ao vento, gente jovem reunida...” –, do compositor e intérprete sobralense Belchior, como elementos intensificadores das lembranças existentes. Também no poema "Há pó de estrelas pelas estradas", no título e no primeiro verso, o poeta Túlio Monteiro dialoga com o poema Plenilúnio, de Raimundo Correia.

Concluindo, destaco, ainda, do poema “Cigana”, certa e resoluta entrega amorosa do eu lírico a sua amada, negando-se a qualquer intenção premonitória – verdadeira ou ardilosa – de uma cigana aparecida em seu caminho; novamente a lembrança se fazendo presente e marcando as sensações amorosas que sente enquanto se permite molhar-se em chuva em “Verde, cor favorita”, poema que se encerra com mais um exemplo de intertextualidade.

No mais, importa ainda declarar a sutileza amorosa do poeta Túlio Monteiro em seu poema “Primeiro poema para Aline Monteiro”. Nele, vê-se um eu lírico alegre, descontraído, distenso, brincando com as palavras e com o registro de letras em algumas delas, de forma cândida para enaltecer a vida de sua musa inspiradora para o poema, a qual trata por princesa, linda, pérola morena, expressões que servem para destacar, dela, uma beleza ímpar.


O que mais dizer desses poemas de Túlio Monteiro nessa antologia? Bem... agora deixo com você, ledor.
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*Chico Araujo - professor, poeta, compositor, contista, cronista, escreve articulista do Evoé! O título "Sem confetes" foi escrito entre 25 e 28 de agosto de 2018.

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