segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

CEMITÉRIO, CATEDRAL E CASTRO E SILVA - Túlio Monteiro*

Eu, com a velha mania de flanar pelas ruas e avenidas dessa Cidade do Sol, um dia me deparei com a Castro e Silva, rua singela no centro de Fortaleza que mal conta com oito ou dez quarteirões. Cismado que sou em ler as placas das ruas, me veio a vontade de saber qual a história daquela. Confesso que não obtive muitas informações históricas além das quais muitos já sabem: os Castro e Silva são de uma linhagem nobre do estado do Ceará com origens em Portugal, como quase todos nós e que Castro nada mais significa que uma cividade (substantivo feminino antigo de cidade) ou citânia sendo um castro de maiores dimensões e importância, habitado continuamente. A designação "citânia" é comparada com o Cytian dos povoados fortificados nas ilhas Britânicas, ou seja, os castros ainda que em ruínas estão quase invariavelmente localizados no topo de montes que eram defesas naturais e permitam o controle tático dos campos em redor. Estes montes tinham sempre fontes pequenas ribeiras onde n´aqueles mais desprovidos de água eram construídos reservatórios pelas populações, provavelmente para resistir aos cercos medievais.

Mas, voltemos à nossa Castro e Silva cearense e a curiosidade que a mesma nos reserva enquanto rua pequena de nossa capital. E desta vez não tive que recorrer aos meus alfarrábios ou sistemas de comunicação de grande porte. Apenas a mente foi utilizada nesta que vos escrevo para as palavras que a em si tomaram o curso do projeto de Kelsen Bravos, de fazermos com ele e o Chico Araújo um Abecedário de Crônicas..

Em conversa com Bernardo Monteiro, meu pai, certo dia ele me perguntou: Quem é que nasce no cemitério e morre na catedral? Eu era apenas um moleque de dez ou dois anos quando afirmei não saber a resposta e ele foi instantâneo em dizer de que não se tratava apenas de uma simples adivinhação. Que eu procurasse a resposta, pois logo mais à noite, depois de um dia de labuta, ele iria buscar a resposta.

Olhemos bem para a época de tal pergunta e retornemos breves para nossas linhas. Não havia ainda a tal da internet nem tampouco o mundo era digital. Tudo ficava na ponta de um lápis em escrita fundamental do que se ia comentar. Foi então que tive a ideia de ir até à casa de meu tio Francisco Pereira da Silva pesquisar em seus grossos volumes da enciclopédia Delta-Larousse para tentar entender algo mais de uma rua que levava nome de gente. Sim! Digo levar gente para um nome de rua porque há cerca de 100 anos o poder público de Fortaleza teimou em numerar as ruas da cidade, bobagem que não demorou muito para ser reconhecida e voltou a estrutura à qual estamos acostumados a nos locomover.

Mas, para findarmos a estrutura desse “mistério” levantado por meu pai, retornemos à pergunta que origina o “C” dessa crônica: Quem é que nasce no cemitério e morre na catedral? Foi só à boca da noite que meu pai chegou de volta que me perguntou se eu havia evoluído no meu raciocínio sobre a referida pergunta, tendo por resposta minha algumas das palavras que vos escrevi anteriormente.

A resposta que tive do criador de meus dias foi simples e objetiva: quem nasce no cemitério e morre na catedral nada mais é que a rua Castro e Silva. Ponto! Isso porque, explicou-me meu velho, ela tem mão única no trânsito, iniciando-se no cemitério São João Batista, vindo por findar, em frente à Catedral Metropolitana de Fortaleza, sendo ela, talvez, a única a ter essa formação geográfica no Mundo todo.

Ficamos, então, com mais uma informação da nossa Fortaleza, tão pouca na memória de nosso povo. Um grande abraço e até o “D”.

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*Túlio Monteiro - Escritor e crítico literário, publica todas as segundas aqui no Evoé! Leia também Literatura com Túlio Monteiro.

4 comentários:

  1. Prezado Túlio, sua breve história com seu pai nos alerta para um viés da História de nossa cidade e, portanto, de nosso povo. Declaro que sua crônica me trouxe lembranças um pouco adormecidas na memória; eu, literalmente, fui nascido em casa que fica à Rua Padre Mororó (personagem histórico sobre o qual já pesquisei por sugestão do querido Lira Neto), a rua que nos leva ao Cemitério São João Batista e que nos põe, a partir do portão dele, de frente para a Rua Castro e Silva. Foram muitas andanças por lá, muitas vivências, quando ainda havia "galos, noites e quintais". Abraço.

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  2. Curioso nobre escritor, no Ceará tem disso sim...nos cearenses somos um povo único e como sempre pioneiro e contestador. Afinal, embira mao única de sentido, mas adequado seria que histórica rua começasse na catedral e terminasse no cemitério. Não podemos deixar de lembrar que nessa simpática rua ainda está inserido um cartório de registro civil de pessoas naturais, talvez o mais antigo, Cartório Noroes Milfontes, por sinal onde foi lavrada a minha certidão de nascimento. E para finalizar meu "pitaco" vou certificar....CURIOSO.. não?

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    1. Esse corretor...onde vê se embira, leia se embora..e onde se le Milfontes lei Milfont.

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  3. A charada de seu pai é para mim doce lembrança de ansiosas férias anuais da menina tímida da serra para ver o mar e viver um mundo de aventuras no casarão de minhas primas onde, entre Princesa e Imperador,a Castro e Silva ainda guarda dor e alegrias de nossa família.Parabéns pela pesquisa,amigo!Já me deu o mote p próxima lida.Rs
    Márcia Matos

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