segunda-feira, 23 de abril de 2018

KARDECISMO ou coisas do reencarnar ou não! - Túlio Monteiro*

Substantivo masculino relativo à doutrina reencarnacionista formulada por Allan Kardec (pseudônimo de Hippolyte Léon Denizard Rivail, escritor francês, 1804-1869), que pretende explicar, segundo uma perspectiva cristã, o movimento cíclico pelo qual um espírito retorna à existência material após a morte do antigo corpo em que habitava, o período intermediário em que se mantém desencarnado, e a evolução ou regressão de caráter moral e intelectual que experimenta na continuidade deste processo.
Em pesquisa feita ao correr dos dedos pelas folhas já um tanto amareladas de meu velho dicionário e, claro, pela Internet, descobri que são 507 as palavras oficializadas em língua portuguesa iniciadas pela letra K. Uma, no entanto, me chamou a atenção pela ligação profunda que sempre tive com o Espiritismo, Doutrina formulada pelo pensador francês Allan Kardec, pseudônimo do pedagogo Hippolyte Léon Denizard Rivail (1804-1869), segundo a qual a pluralidade das existências dos espíritos, em um movimento cíclico e contínuo de vários renascimentos em novos corpos materiais, a já famosa reencarnação, lhes permite evoluir moral e intelectualmente até alcançar a perfeição, conforme citação feita na epígrafe deste meu texto.

Um dos maiores engodos religiosos de nossa época é o Espiritismo kardecista, onde os seguidores de Kardec, acreditam que nele vivemos o autêntico cristianismo. Podemos então – a partir desse princípio – crer nisso? Já que o Kardecismo prega a mediunidade, a caridade como tábua de salvação e a tão sonhada reencarnação em vidas mais avançadas e úteis à humanidade? É sabido que estas considerações são necessárias à evolução dos espíritos, bem como estes, através das dificuldades da vida e das boas obras, podem expiar suas culpas, reparar seu passado e acumular méritos até se tornarem perfeitos. Nunca tão perfeitos quanto Deus, mas tendo a perfeição que o Criador e a criatura comportam.

Alcançar a salvação é então – na linguagem Espírita – atingir essa inevitável perfeição. Sim, inevitável perfeição, pois o Kardecismo prega que ninguém será condenado eternamente, levando em conta que, mais cedo ou mais tarde, todos os espíritos avançarão rumo à essa tal perfeição e a alcançarão, indubitavelmente.

O Kardecismo se considera genuinamente cristão, bem como a terceira revelação de Deus à Humanidade. Pregam os kardecistas que a primeira revelação de Deus é o Antigo Testamento; a segunda o Novo Testamento. Onde o Kardecismo, ocupa o lugar de destaque como última e derradeira revelação do Final dos Tempos.

Nasci e fui batizado Cristão! Mas como todo poeta de boa estirpe nunca me conformei com os ritos e ladainhas das incontáveis missas que assisti até criar calos nos ouvidos. Por conta dessas certezas tão corretas oradas em missais, me descobri ensimesmado, confuso e questionador quanto às ordens nos dadas na Primeira Comunhão, quando lá pelos dez anos de tenra idade já não me considerava um católico puro. Precisava conhecer novas culturas e consequentemente novas crenças...novos caminhos possíveis de seguir.

Daí ao pulo derradeiro do católico para o espírita não demorou muito. Ao ler O evangelho segundo o espiritismo, livro de Kardec, encontrei respostas às muitas perguntas que assolavam minha alma vã. O que levou-me a aprofundar meus estudos em relação à doutrina e passar a frequentar sessões espíritas de linha branca, onde encontrei, durante algum tempo, consolo aos meus tormentos de simples mortal. Repito: durante algum tempo! Uma vez que com o passar dos anos também me tornei questionador dos princípios espíritas, sempre tão corretos e reconfortantes.

Sempre excelentemente explicativo, nos princípios elaborados por seu criador, descobri que o Espiritismo já não me cabia mais. Era deveras correto demais para ser tão coberto de razões e correções no tocante aos erros cometidos pelo corpo carnal e consequentes punições ao corpo espiritual. Os porquês de castigos impetrados ao meu corpo físico, bem como aos corpos físicos e espirituais de meus mais caros parentes não me conformavam. O que me conduziu mais uma vez a ir deixando de lado outro tão apaixonante seguimento das crenças humanas.

Resultado: hoje não possuo mais religião ou crença. Sou um barco sem proa rumo a um horizonte nebuloso e cheio de tormentas, tendo por confessor apenas o marulho advindo do quebrar de ondas no entorno da minha embarcação chamada corpo carnal. Não! Não creio mais no Espiritismo nem nas suas pregações relativas a um Deus tão castigador. Até porque não acredito que o criador do nosso planeta seja um Deus tão incomplacente para com os seus. O que fez gerar embates comigo mesmo sobre as diferenças entre Criador e Criatura. O que lentamente está enlouquecendo esse escritor ateu em sentido amplo.

Em relação ao final de minha história por aqui enquanto Túlio Monteiro ninguém sabe o fim. Uma vez que em nenhuma religião, doutrina ou crença que frequentei me foi dada com clareza semelhante resposta. Por enquanto, vou seguindo conforme o destino desejar. Esperando, claro, amados leitores, que ao meu fechar de cortinas ou derradeiro suspiro encontre eu a tão sonhada Paz Eterna nessa minha conduta muito repreensiva nesses tempos de reencarnar ou não.

Findo por aqui, então, minha crônica semanal do desafiante abecedário Evoé! Tenho certeza de que sofrerei muito com suas reprovações, sejam elas explicitadas nos comentários do blog ou não. Mas não posso me furtar a dizer-lhes que o inferno astral pelo qual ando passando nos últimos anos me tornou esse sujeito um tanto quanto soturno e descrente das coisas dessa vida material que só leva em conta os cifrões de nossas contas bancárias e boas ações praticadas sem nenhum interesse – coisa que também creio ser impossível, pois é inerente aos seres humanos pelo menos um agradecimento ou um muito obrigado como retorno – o que revela que todos nós, de uma forma ou de outra, temos erros capitais sejam em relação ao deslize em um dos Dez Mandamentos cristãos ou às diretrizes espíritas bem providas de senso. Um imenso abraço e até mais!

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*Túlio Monteiro - escritor, crítico literário, pública todas as segundas aqui no Evoé! O texto "KARDECISMO ou coisas do reencarnar ou não!" foi escrito no dia 22.04.2018. Leia também Literatura com Túlio Monteiro.



4 comentários:

  1. Como diria o genial Chico Anysio, "Cearense não nasce, estreia, e não morre sai de cena"... então nesse caminhar que sejamos: católicos, evangélicos, muçulmanos, budistas, e até ATEUS, mas que não nos percamos no caminho...pois ja cantou o não menos famoso Raul Seixas" Há tantos caminhos , tantas portas mas somente um tem coração". E para encerrar esse singelo comentário relembro meu saudoso pai com seus ensinamentos simples: " meu filho na vida procure não ter duas coisas dúvidas e dividas"...

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  2. Eu que nada sei de espiritismo, mas tenho estreitado minha relação com DEUS.
    Deus foi apresentado pra mim na religião católica, que é a doutrina que a maioria da minha família segue até hoje, depois veio todo uma catequização nas escolas confessionais que estudei e nas nas missas que participava, ás vezes até obrigada.
    Pois bem, ali iniciou um desacreditar de sua existências, mas não. Deus fez seu primeiro teste sobre a minha fé no seio familiar e levei alguns anos pra entender que Ele não era culpado pela decisões humanas, tinha nos dado o livre arbítrio. Foram anos me perguntando dos por quês? E assim como você, não consigo achar explicação no Kardecismo, então tentei traçar outros caminhos em busca de sanar a ferida.
    Quando meus pais se separaram diferente de outras crianças para mim foi um alívio, porque não era saudável um ambiente de gritaria e de violência domestica. E naquelas ocasiões, questionei, porque a minha família era infeliz e a do vizinho não. Enfim, seria muita responsabilidade culpar a Deus por aquilo.
    Meu primeiro encontro com Deus se deu numa igreja Batista, também cristã, quando uma vizinha evangélica me convidou ao culto. Ali no louvor Deus me visitou e tem me visitado, fazendo comigo novas configurações dessa história chamada vida. Não tornei-me evangélica. Continuei católica e na crisma aos 15 anos pude ler e estudar o evangelho e compreender Deus doutra forma, mais madura e mais eloquente. De tal modo, que entendi que não é a religião ou a igreja, Deus se faz presente na gente, seu maior templo. E em nós que Ele quer habitar e fazer morada. Só assim o evangelho faz sentido. E se torna palpável mediante as relações a nós confiadas ou intercruzadas com a nossa existência.
    Então Deus maturou, de tal modo, que tenho prazer em conversar com Ele quando converso contigo. Acredito que Deus está em ti e em várias pessoas. Pra mim Deus está na esquina, no cumprimento de bom dia, nas relações profissionais e camaradas que tenho, no respeito ao próximo. Deus nos quer santo e puro de corações, esse exercício mais difícil, porque a vida é doce, que nem rapadura, né mole não. Daí fazer o certo requer em nós muita certeza de que esse é caminho, por mais complicado que seja.
    Já duvidei sobre o amor de Deus por mim, da sua existência, da sua presença. Já me senti injustiçada por Ele, abandonada em meio a algumas situações. Mas confesso, também já me senti amparada, cuidada por Ele por meio de uma amigo, pais, irmãos e até de um estranho.
    Quem sabe tenhas dado o primeiro passo pra esse encontro, basta observar, vais entender quando Ele te visitar.
    Boa semana.
    E Deus te guarde sempre.

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  3. Caríssimo Túlio Monteiro, suas questões compõem seu caminhar, seu estar no mundo e não ouso questioná-las. São legítimas. Pelas palavras, intuímos crenças, mesmo não reveladas. Sem muitas delas, ficamos sem referência, meio que transitamos, como sugeriu, à deriva, ao sabor dos ventos, dos acasos.

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  4. Eu gostei muito dessa crônica; nela não consegui ver nenhuma ofensa, mas a discorrência de um cronista de mão cheia sobre questões existenciais. Aqui não se pode tomar o texto como bandeira ou ofensa a nenhuma crença. Há que se captar que a essência do texto reside nas inquietações do eu, na direção de suas indagações. E não me refiro ao eu do autor somente, mas a um eu genérico, universal, já que o miolo do texto abarca questões humanas, quando questiona a existência como elemento propulsor de tudo. Uma beleza de texto, costurado com um ingrediente obrigatório no gênero, que é a espontaneidade e fluência dialogal! É preciso que se entenda que a crônica é um texto despretensioso no sentido de imposição, tese, já que é um texto literário, despido da aprovação e autoridade científica. Um texto em que o autor evoca seus pensamentos sobre o tema e discorre sobre este como em uma conversa com amigos, e Túlio faz isso com propriedade e ingredientes de sobra.

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