quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Quando alguém parte... *SÉRGIO ARAUJO/CHICO ARAUJO

A todos os que um dia partiram dessa dimensão em que me encontro.
A todos os que um dia viram partir, dessa dimensão em que nos encontramos, alguém que desejou nunca fosse.
A todos os que cremos nas dimensões.

Quando alguém parte, elos bem firmes não se corrompem por bem realizados.

Quando alguém parte, e essa partida a transporta para uma dimensão sobre a qual não temos qualquer ingerência, até pouquíssima compreensão, os elos bem firmes que não se corrompem criam fios invisíveis tecidos em saudade e lembranças igualmente sólidas.

Quando alguém parte, o incômodo que sua partida gera em quem fica denuncia a proximidade lastrada em tempos de convívio.

Quem fica sente liberarem-se de si sensações e sentimentos que não se podem conter, que não se podem represar. Embora muitas vezes não se consiga perceber, esses processos sensoriais, esses afloramentos de emoções, esse misto de lembranças prazerosas e saudade dorida urdem ensinamentos para desenvolvermos fortaleza, neutralizando o risco de nos prostrarmos, fracos, decaídos.

Quando alguém parte, deixando em quem fica a certeza de nesse lado de aqui nunca mais um novo encontro, um novo abraço, um novo sorriso, um novo olhar, uma nova palavra, um novo carinho, um novo beijo, um novo estar junto, um novo toque, um novo conselho, um novo aconchego... o vazio-abismo surgido, ao mesmo tempo em que significa o que significa, propõe seja feito seu preenchimento com o tudo que fica, cada parte dele sendo degrau que permita a emersão daquele abismo.

Quem fica e declara um “até logo”, um “até breve”, ainda que desconstruído, crê no reencontro num qualquer dia, numa hora qualquer – conquanto exata –, inexorável. Quem fica e crê nesse rever-se, nesse avistar-se de novo, põe em lenta e constante alimentação seu espírito com manjares de esperança, avivando chamas, atiçando brasas, suplantando as expiações.

Quando alguém parte, concede a quem fica a chance do reinventar-se pela ausência imperativa.

Das rupturas, a regeneração, a renovação.

Quando alguém parte, insere na existência o fascínio, o encanto do não se extinguir, porque, quando parte, inexoravelmente, também fica. Para sempre.

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*Chico Araujo (Sérgio Araujo) - publica toda quarta-feira no Evoé! O título "Quaundo alguém parte..." foi escrito entre os dias 01 e 07 de novembro de 2017.  Leia mais Chico Araujo no blog Vida, minha vida...


[Este texto deveria ter ido a público dia 8 de novembro; mas este blog não conseguiu cumprir o compromisso com o seu articulista e leitores, por problemas humanos do editor que, em vez de programar "Quando alguém parte..." programou outro: "Crônica do Despautério de um colegiado corporativo" o para o dia 8, que não ficou visível ao público. Peço desculpas. KB]

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