sexta-feira, 6 de abril de 2018

...de H - Kelsen Bravos*

Não lembro de quando ouvi pela primeira vez a expressão "...de H", mas, sempre que penso nela, me vem a imagem de um primo querido explicando estratégia para se livrar de uma situação limite. Algo assim como a ginga de um bom capoeira que engana o olhar do oponente e confunde-lhe a lógica sobre a movimentação mandingueira.

Cabe também explicar o termo como sendo o drible no futebol, o bom e velho traço no adversário, cujo maior mestre é Garrincha. Uma vez ouvi o seguinte comentário sobre um traço a la Garrincha: "rapaz, foi assim: ele, um bocado de vez, fez que foi e não foi e, quando ninguém esperava, acabou fondo." Podemos concluir, então, ser o "...de H" aquilo que se aparenta fazer para esconder o que de fato se está fazendo. É mostrar para esconder. É não ser para garantir continuar sendo independente de inoportunos estraga-prazeres.

Essa energúmena figura, o estraga-prazeres, é muito bem definida por Chico Buarque de Holanda em "Apesar de você". A música lançada em 1970 foi um protesto contra a ditadura. O pronome refere o general Emílio Garrastazu Médici, o ditador de então. Nos dias de hoje, com muita paciência, vemos crescer em importância os versos da segunda estrofe da música de Chico: "Você que inventou esse Estado/ Inventou de inventar/ Toda escuridão/ Você que inventou o pecado/ Esqueceu-se de inventar o perdão."

Nos dias de hoje, esse Estado é uma nova ditadura, muito bem planejada e executada em um golpe político-jurídico-midiático. Essa tríade golpista é o você no apesar de quem da música  Em tudo que esse tal você faz, entra em cena o de H, pois se apresenta como uma defensora da Justiça, mas é só de H, diz defender a democracia, o estado democrático de direito, mas é só de H, diz representar o povo, mas é só de H, pois tudo que diz já está escrito, já está previsto e se algo sair do script do jogo de cena que planejou, muda o jogo, diz que o real não é real, pois o real é o discurso de H que faz, é o que repercute a grande mídia, que há muito abandonou a função de informar bem a fim de formar opinião pública de alto senso crítico para assumir o mero e vergonhoso papel de veicular opinião publicada de H, que os golpistas "inventaram de inventar".

A "toda escuridão", referida na música, nos dias de hoje, é a tão surreal situação que torna estraga-prazeres o Lula, a Dilma, representantes - eleitos! - que honraram e honram a Nação Brasileira. Vejam bem! O "você" deles é a Nação Brasileira. Promoveram um impeachment de H da presidenta Dilma. Foi impeachment de H, porque a presidenta não cometeu crime de responsabilidade algum. Foi golpe, mas a mídia diz que não. Vendem o país a preço de banana; mas dizem que é lucrativo. Lucrativo de H, pois colocam o país refém dos rentistas mundiais. Dizem combater a corrupção, mas é de H, pois de fato protegem e promovem a corrupção, quando argumentam que crimes com fartas provas não vêm ao caso e rasgam a Constituição Federal para condenar sem provas e prender inocentes. Que "pecado"! Sinto arrepios só de imaginá-los promovendo o "perdão", com certeza será um perdão de H.

Esse jogo de H, espero, esteja, nos dias de hoje, enquadrado pelo vaticínio de Ivan Lins e Vitor Martins na música Cartomante, que nos manda - para ficarmos vivos! - não dar motivo aos golpistas. Recomenda termos paciência, pois, segundo as cartas, as estrelas, os búzios e as profecias, já há de cair o Rei de espadas, o Rei de ouros, o Rei de paus... de tal modo a não ficar nada! É de H, meu povo, na verdade, como bons capoeiras, vamos nos aquietar e ceder ao poder deles, sejamos submissos, estamos derrotados... Evoé!

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Kelsen Bravos - professor, escritor, compositor e editor do Evoé!



6 comentários:

  1. Até estou acreditando que estão sempre com "medo do medo que dá ". Sabedoria popular, Chico Buarque, Ivan Lins, Victor Martins em um digno escrito alegre, sincero, sincero, verdadeiro. O mais... É só "de H".

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  2. Meu Caro Amigo Chico Araujo, por esses dias tenho ouvido internamente sons de atabaque ritmando-me por inteiro o corpo e me faz cantarolar uma bênção e o refrão na voz de Maria Bethânia que em Carta de Amor diz: "não mexe comigo, que eu não ando só, eu não só. Não mexe não!"

    Estamos juntos, amigo, não estamos sós!

    A nossa causa é justa!

    Evoé!

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  3. Uma causa justa e não estamos sós. Todas as frentes se unificar, cada uma sendo uma e sendo mais, porquanto elos em corrente se (re)tecendo. As frentes de cada um na "frente" de todos em uma. À frente.

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  4. Seria apatia ou desunião da própria esquerda? Que sociedade é essa que diante de tal feito não se ver ameaçada? Só de H ou só capa, como dizem pras minhas bandas, assisti e ouvi fogos comemorando a prisão do Lula, assim como ocorreu no Impeachment da Dilma, e desde lá, o que temos feito? Se o poder emana do povo, que façamos de fato algo por esse país antes dele ser entregue a outros poderes que não representam o pensar livre. Tempos sombrios. Lula foi e continuará sendo a realidade de muitos e também será o gosto amargo da "justiça" que o condenou. O feito do homem não será apagado, mas me pergunto e agora? Iremos agir quando a nossa liberdade não mais existir e estivermos encarcerados, se já não estamos em nosso guetos e caixinhas. Continuaremos inertes na frente do noticiário? Na verdade, temos aceitado que seja concretizado paulatinamente o projeto político que corrobora pra desigualdade social que temos vivido atualmente. Reclamamos, contudo, poucos estão dispostos a sair da sua zona de conforto (se é que ela existe). Nana

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  5. Apatia é omissão, quem se omite perde até comiseração. "Quem sabe faz a hora, não espera acontecer." Você tem plena razão, Nana.

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