Surpreender um turbilhão de sentidos no cotidiano, eis o que mais me encanta na crônica. Aqui vai um exemplo em pelo menos duas linguagens, a fotografia e a escrita, uma multiplicando a metáfora da outra. A foto de Marília Vieira e o texto de Ana Carolina Bittencourt e Cláudio Fontenele se amalgamam em poética metamorfose para revelar, a la Rubem Braga, colorida borboleta no cinza da metrópole. (KB)
ESPERANÇA EM FLAGRANTE DELITO
O semáforo ficou verde.
por todos os lados. Motoristas frenéticos.
Atraso.
Pais deixando seus filhos nas escolas.
Ônibus lotado.
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Foto: MaríliaVieira |
Faixa de pedestres bloqueada. Xingamentos.
Obra na pista.
Fumaça, muita fumaça.
O semáforo ficou vermelho.
Buzinas. Mais xingamentos.
Carros caindo no mesmo buraco, como numa coreografia ensaiada.
Murmúrios.
Carros parados. Vidros fechados para os panfletos e os pedintes.
Sinal verde.
Motos sobem as calçadas, driblando e aumentando o caos.
A quase duas quadras dali, crianças arrastam suas mochilas, abrem os seus livros, exibem seus lápis coloridos e relatam seus passeios de final de semana.
Mas ela parece estar ali, quase fazendo parte do cenário.
Se você observar bem, ela criou asas!
Ela é livre!
Ela preferiu abrir um livro.
O seu nome eu talvez nunca venha a saber, mas resolvi chamá-la de Esperança.
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Escritora e escritor:
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Ana Carolina Bittencourt |
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Cláudio Fontenele |
Dolorosa a crônica em forma de poesia, mas dura como a realidade. Nó na garganta, dor no peito e no estômago. Os filhos de ninguém são muitos nesse Brasil. Espero que esperança esteja bem. Túlio Monteiro.
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