segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Feira dos pássaros

Domingo é dia de feira livre. Em Fortaleza a mais famosa é a da lagoa de Parangaba. Aliás o seu nome é uma corruptela de porangaba, que em tupi quer dizer beleza. Sabiam mesmo os nativos denominar os cenários naturais, prova inconteste da efetividade linguística de sua cultura.

Acordar cedo e mandar-se para lá num dia ensolarado, é como entrar num túnel do tempo. A feira da Parangaba, conhecida como feira dos Pássaros, nos remete a um ambiente, no mínimo, quinhentista.

Aguadeiros de Funchal. Fonte: azeferino.web.simplesnet.pt 
Àquela época na Europa, iam às feiras em busca de especiarias vindas do Oriente figuras como monges e abades; nobres e burgueses; donzelas e namoradeiras; mulheres da vida e marinheiros; aguadeiros (foto) e catadoras de piolho; contadores de histórias, jograis, trovadores, fantoches e saltimbancos; arautos e peregrinos; escravos e pedintes.

O espaço da feira principiava onde se começava a ouvir os anúncios e findava onde se deixava de ouvi-los. Esses pregões teciam a malha que formava uma espécie de um toldo invisível, constituído por um entrecruzar de vozes, um bulício; mas de aparente desordem.

Assim também é a feira dos Pássaros. Lá se compra e se vende do treco ao quetreco, inclusive especiarias do Oriente e do Extremo Oriente, Taiwan, por exemplo. Em vez de jograis e trovadores, encontramos cordelistas e cantadores; escravos decerto não há, em seus lugares estão os equilibristas da corda bamba da vida, e muito mais pedintes, infelizmente.

Ela tem esse nome, porque antes concentrava venda de animais, sobretudo, pássaros. Era bicho de tudo quanto é espécie. Bobeasse era capaz de encontrar até um dodó legítimo das ilhas Maurício. O Ibama chegou por ali para pôr fim aos abusos contra os espécimes naturais. Mas só de alguns é proibida a comercialização. Dodó das ilhas Maurício, por exemplo, quem quiser é só ir lá e encomendar.

A lagoa da Parangaba é habitada por jacarés e cobra das boas. Vez ou outra os bombeiros aparecem resgatando uma cobra-de-veado gigante ou mesmo uma sucuri. Os jacarés também algumas vezes dão o ar de sua graça. São enormes. Dizem que os fiscais do Ibama foram responsáveis por esses animais habitarem a lagoa, pois, quando chegavam as blitzen, os infratores para livrarem-se do flagrante jogavam os animais ainda filhotes dentro dágua.

Tem gente que não deixa de ir um domingo sequer. Cresceu sendo levado pelo pai à feira, hoje leva o filho e promete levar o neto. A intenção de algumas dessas pessoas é aprender na prática as regras do comércio. Há negócio de tudo quanto é jeito. Chegam com no máximo dez reais e saem com cem. Não importa o valor, o importante é fazer negócio e sair lucrando. Pode ser uma relação de compra envolvendo dinheiro ou escambo de mercadoria, enfim toda forma de transação comercial. Vale tudo que é argumento, grito, palavrão, cara feia, enfim é um regateio, uma negociação no mais puro estilo árabe.

2 comentários:

  1. Parabéns, velho Kapeta! Registro de nossos espaços urbanos onde o povo cria sua história e nossa identidade. Habito no bairro e resgatei outro dia a história trágica da índia Porangaba...GRANDE ABRAÇO marciamtb@hotmail.cm!

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  2. Olá Marcia,

    Mandei e-mail pra você. Obrigado pela visita e pelo comentário.

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