domingo, 21 de maio de 2017

COSTURA, TESSITURA E CONTEXTURA - Chico Araujo

Chico Araujo escreve toda quarta aqui no Evoé! De modo excepcional, publicamos hoje, 21/05/2017, domingo, este diálogo com outro articulista e você leitor. Bom papo a todos. (KB)


John Melhuish Strudwick - As três parcas
Licença, leitor: começo por um óbvio, via Aurélio Buarque de Holanda, que nos diz, a respeito do vocábulo “costura”: Trabalho feito com agulha e fio, e/ou tecido ou outro material costurado ou a costurar. Ainda: Sutura de tecidos. Apenas duas breves obviedades dicionarizadas e, de concreto, já costuro meu texto com a fala do respeitado dicionarista – minha agulha e meu fio, a palavra. Um êxtase sedutor esse de tecer palavras com palavras, ideias com ideias, pensamentos com pensamentos num processo contínuo de tessitura de textos. Já metaforizo e pela metáfora dialogo com o lexicógrafo.

Pois bem, esse meu início, leitor, afirmo, não teve princípio exatamente quando pus a primeira palavra que você lê no parágrafo anterior. Não, não mesmo. Em verdade, ele começou a ser construído quando li texto da lavra de Túlio Monteiro em “conversa” com Para onde vão no passo a passo do dia a dia? , este, de minha autoria, arquitetado dias antes da escritura dele.

Ahhh, leitor, que mundo mágico e poderoso esse das palavras! Por causa da existência delas e dos sentidos que possam edificar, dialogamos, Túlio e eu, e, agora, eu e você que está se permitindo essa leitura. Nesse diálogo, “que não se sabe exatamente onde começa nem exatamente onde terminará – se terminar”, vamos descortinando nossas experiências de vida, nossos desejos, nossas desilusões, nossas esperanças, nossos mais profundos conhecimentos, os quais muitas vezes nem temos consciência de os conhecer.

Em seu Dialogando com Chico, Túlio Monteiro, por ascendê-lo de sua memória e imprimi-lo em sua escrita, primeiramente nos faz conversar com ninguém menos que Carlos Drummond de Andrade; em assim fazendo, fixa, em seu próprio texto, falas que são de Monteiro, mas que bem antes foram de Drummond e, bem recentemente, de Araujo. Percebe essa tessitura, leitor? Um pensar que se amplia em novo pensar cujo significado não necessariamente difere do anterior, embora possa ampliá-lo, (re)dimensioná-lo e refleti-lo ali, um pouco mais além, em um outro dizer. Ahhh, leitor, esse universo das palavras e suas ideias é uma intensa e extensa teia, envolvendo, enredando todos nós.

Quando as pessoas se expressam, não fazem isso sem motivo. Quem fala e quem escreve, sabe o porquê de estar falando, o porquê de estar escrevendo. É a exata quase certeza de que ninguém diz nada à toa. Somos, então, naturalmente, falantes de contextos; e quando nos fascinamos em vislumbrar a presença de Albert Camus na escritura de Túlio Monteiro dialogando com Chico Araujo, experimentamos uma contextura de ideias as quais se aproximam, se somam, se (re)dimensionam e se expandem, possibilitando outro experienciar.

Tudo isso, caríssimo leitor, insere você nesse meu falar aqui, bem como expõe esse amálgama de palavras e ideias e sentidos tecidos não somente por Andrade, por Camus, por Monteiro e por Araujo, mas por tantos outros de antes deles e muitos outros tantos de depois. Ahhh, leitor, esse universo das palavras e suas ideias é uma intensa e extensa teia, envolvendo, enredando todos nós; quem dera pudesse todo homem ter acesso pleno ao direito de se entrelaçar nesse universo para ter melhor consciência desse mundo, vasto mundo que nos rodeia, pois certamente poderia participar com maior integridade dos espaços de cidadania.

Se “O operário de hoje trabalha todos os dias em sua vida, executando as mesmas tarefas” e “Esse destino não é menos absurdo, mas é trágico quando apenas em raros momentos ele se torna consciente”, importa que se liberte dos limites não autoimpostos. É certo que essa libertação chega-lhe quando conhece mais, vê mais, sabe mais. Creio: nem sempre é bom que sejamos os mesmos e que vivamos como nossos pais.

Assim como Monteiro declara e mesmo Lira Neto, em 1998, expôs sua condição de herdeiro de Sísifo, me vejo também, por analogia, na condição de condutor de palavras, como agora faço. Nessa ação vou (re)construindo caminhos de ideias, passagens para sentidos. Nesse percurso, me (re)crio... até que meu tempo se conclua.

___________
Chico Araujo escreve toda quarta-feira no Evoé. Leia também o blog Vida, Minha Vida.

3 comentários:

  1. ahhhhhh, Araujo...esse embate só trás aos nosso ledores algo mais para deliciarem-se com palavras colocadas de maneira certa e na maneira correta. A coisa já foi tão longe, Chico...que até preparei um artigo científico ligado(de certa forma instigado) ao seu primeiro escrito. Veja se pode? Pode! E tanto pode que já vai ser lançado amanhã pela Universidade Vale do Jaguaribe, na Revista Socializando, de produção do corpo docente de lá. Acredito que Kelsen não se oporá em colocá-lo aqui logo mais à meia-noite para que nosso quarto "round" se inicie. Risos. Obrigado por me citar em seus intra textos. Túlio Monteiro.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. CORREÇÃO: Onde se na primeira linha a palavra trás, favor substitui-la pela conjugação verbal TRAZ. Túlio Monteiro.

      Excluir
    2. ahhhhh, Monteiro... Muitos gostam de "combater o bom combate" - o que, em algumas situações, sei que cremos juntos, é bastante válido e oportuno -; a nós, pelo menos nesses instantes de agora, coube-nos "dialogar em bons diálogos". Então, que venham os ledores participar desses diálogos; sabemos que eles nos enriquecerão pelas falas deles. E já estou na curiosidade para conhecer o artigo científico - certa ressonância do dialogismo principiado (?) aqui.

      Excluir